Nos últimos anos, a EY desenvolveu para a Corticeira Amorim diversos estudos com vista à avaliação dos impactos ambientais, sociais e económicos da empresa. Enquadrados na estratégia de sustentabilidade do grupo, assente nos três pilares ESG (Environment, Social and Governance), estes estudos incluíram uma importante avaliação dos serviços do ecossistema do montado, e permitiram calcular as pegadas ambientais de diversos produtos. João Alves, Managing Director da EY em Portugal, Angola e Moçambique, acompanhou de muito perto os estudos, e destaca as suas principais conclusões, assim como a importância da quantificação como base da valorização.
O conceito dos serviços dos ecossistemas, que pode ser definido como os contributos da natureza para o bem-estar das pessoas, tem sido determinante no aumento da perceção pública relativa à importância da conservação dos ecossistemas e da biodiversidade. Este conceito introduz uma perspetiva em que os ecossistemas e a biodiversidade são parte de um capital, que é natural, responsável pelo fornecimento de múltiplos bens materiais ou experiências essenciais para a qualidade de vida da sociedade. Esta narrativa realça a dependência do ser humano relativamente à sustentabilidade deste capital natural, como imperativo para a sua própria sobrevivência como espécie a longo prazo. Um exemplo emblemático destes serviços é a regulação climática por via do sequestro de carbono das florestas, um contributo essencial da natureza para mitigar os impactos das alterações climáticas e para atingir a neutralidade carbónica em 2050. Entre muitos outros, encontram-se também os serviços deregulação hidrológica, de prevenção de eventos extremos como cheias e incêndios, a polinização realizada pelas abelhas às culturas agrícolas, até ao potencial para recreio de experiências na natureza como o ecoturismo, que demonstram os benefícios diretos e indiretos que a sociedade pode retirar dos ecossistemas. A avaliação destes serviços é assim fundamental para tornar tangível o valor representado pela conservação dos ecossistemas e da biodiversidade nos ciclos económicos, permitindo maximizar cada vez mais a sua integração nos quadros de gestão e tomada de decisão a nível territorial. Esta tendência tem sido registada ao nível da União Europeia, através do compromisso dos seus Estadosmembros de mapearem e avaliarem a condição dos ecossistemas e serviços por eles prestados, assim como avaliar o respetivo valor económico associado aos benefícios deles retirados, de modo a integrar estes fluxos nos sistemas nacionais contabilísticos e de reporte. Este contexto reforça assim a necessidade das empresas alinharem as suas políticas e estratégias de sustentabilidade com esta agenda, como se verificou de forma mais premente em 2020 por diversas empresas (e.g.: ao subscreverem a iniciativa Act4Nature).
A quantificação dos serviços dos ecossistemas é, em primeiro lugar, importante para compreender a complexa interação
dos processos biológicos e ecológicos que resultam no fornecimento de um serviço, e no fundo fornecer as bases para o gestor do território intervir no sistema, no sentido de maximizar o fornecimento dos serviços dos ecossistemas de forma sustentável. Numa segunda dimensão, a quantificação é a base da valorização, fundamental para informar a integração do valor dos serviços dos ecossistemas nos sistemas contabilísticos, na avaliação de impactos em projetos, ou no desenvolvimento de instrumentos económicos como os programas de remuneração dos serviços dos ecossistemas (atribuídos aos proprietários que optem por uma gestão florestal e rural compatível com o fornecimento de serviços de valor ecológico e monetário). Do ponto de vista de uma empresa, a quantificação e a valorização dos seus impactos diretos e indiretos nos ecossistemas e seus serviços, assim como a avaliação do risco da sua dependência ao capital natural, é crucial para compreender verdadeiramente a extensão da pegada das atividades e operações associadas à sua cadeia valor na degradação ou preservação dos ecossistemas e da biodiversidade.
No estudo desenvolvido pela EY, The value of cork oak montado ecosystem services, a avaliação dos serviços dos ecossistemas teve como base o recurso a metodologias de mapeamento e quantificação de serviços através de sistemas de informação geográfica, cartografia e inventários florestais fornecidos por quatro casos de estudo. Nesta avaliação, três serviços foram monetizados: regulação climática; regulação de eventos extremos; prevenção de incêndios, regulação hidrológica e proteção do solo. A valorização teve em conta o método dos custos evitados, i.e., o custo social para a sociedade em remediar os danos ambientais associados à ausência do serviço do ecossistema. Por exemplo, os custos sociais relacionados com as emissões de gases com efeito de estufa são um resultado dos danos causados às culturas agrícolas, cuidados médicos associados às vagas de calor e secas, assim como os danos causados pelas inundações e subida do nível do mar. Considerando o serviço de regulação climática, a consideração de um custo social do carbono (€/tonelada de CO2eq emitido), permite assim estimar o valor monetário associado a este serviço do ecossistema.
O estudo desenvolvido pela EY concluiu, com base nos casos de estudo selecionados, que os montados de sobro proporcionam benefícios à sociedade com um valor médio superior a 1300 €/ha por ano. Ainda assim, o valor dos serviços totais quantificados é uma subestimativa do valor total dos serviços do ecossistema montado. Este ecossistema tem um papel essencial na manutenção da biodiversidade e dos habitats, responsáveis por funções ecológicas de valor inestimável, sendo que algumas ainda não são totalmente compreendidas pela humanidade. Existe ainda um complexo de benefícios gerados para a sociedade que vão desde os serviços de provisão, regulação ou ainda serviços culturais. Estes serviços são avaliados no estudo através de informação qualitativa e quantitativa de modo a fornecer um conjunto de informação útil sobre a dimensão dos contributos identificados.
Este trabalho permite demonstrar o valor associado ao montado, que vai muito além da sua importância paisagística, que faz parte da identidade cultural de Portugal e do Mediterrâneo, e das múltiplas aplicações da cortiça em diversos sectores. Demonstra aos diversos stakeholders do setor da cortiça e dos seus produtos, os benefícios societais associados a uma boa gestão do montado, podendo servir como catalisador de adoção de práticas de gestão que compatibilizem exploração com conservação no restante território português. São igualmente um bom exemplo de como as empresas podem beneficiar do conhecimento sobre os seus impactos e dependências do capital natural, quer em termos reputacionais, quer através da demonstração do seu contributo para atingir objetivos de política pública em matéria de conservação da biodiversidade e serviços dos ecossistemas.